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Forma e Conteúdo

  A World Wide Web é hoje a parte mais visível da Internet e aquela que mais atenção e desenvolvimentos tem atraído. Após os primeiros anos de preponderância do texto (até 1996), o HTML evoluiu na direcção de um melhor controlo da apresentação em página. O primeiro grande salto foi a implementação das tabelas e o segundo a definição do DHTML.

  A consequência natural desta tendência foi a generalização dos editores para a Web do tipo WYSIWYG (what you see is what you get), que permitiriam definir exactamente a apresentação dos conteúdos, e o primado dos efeitos visuais sobre o conteúdo.  Hoje, a Web é um meio de comunicação visual, onde cada site disputa aos outos a atenção dos visitantes. Com esse fim constroem-se sites cada vez mais sofisticados e visualmente apelativos.

  Julgo que esta abordagem é errada pelos seguintes motivos, que explanarei de seguida:

  1. Os utilizadores procuram conteúdos
  2. Os interfaces da Web são heterogéneos
  3. O conteúdo é orientado para o utilizador

Nota:  Esta reflexão destina-se especialmente aos criadores de conteúdos, mas não tem termos técnicos dificultem a compreensão à generalidade dos leitores.

Os utilizadores procuram conteúdos

  Se o leitor é também autor de sites, gostará tanto quanto eu de receber numerosas visitas. No seu círculo de amizades, encontrará meia dúzia de pessoas (entre as quais a sua mãe ;-) ) que visitarão os seus sites, qualquer que seja o seu conteúdo. Mas todos os outros visitantes procuram conteúdos e não web design.

  Digo procuram com ênfase, pois a procura é a principal actividade da Web. Procura-se em motores de busca, procura-se em portais, procura-se saltando de hyperlink em hyperlink, procura-se por e-mail, em suma, procura-se por todas as formas.

  Talvez pela primeira vez na História haja a noção que existe uma "biblioteca universal distribuída" onde se armazena todo o conhecimento da humanidade. O grande problema é encontrar em tempo útil a informação que se procura. E quantas vezes não sentiu o leitor que a informação "está lá, algures," apesar da procura não ter dado os resultados desejados?

  Ao partir para a criação ou ampliação de um site, a principal preocupação deve ser servir o utilizador. E para tal, as sete perguntas chave a repetir antes de iniciar o trabalho são:

1. O que tenho para apresentar aos outros?
Esta é a pergunta capital, a fazer antes de começar o site. Se não tenho nada para apresentar, mais vale não perder tempo e utilizá-lo doutra forma, porventura a visitar sites interessantes.
Todavia, quando o leitor chega ao ponto de querer participar na Web, pensa que tem algo a acrescentar. Se assim fôr, junte tudo aquilo que gostaria de encontrar no seu site, e organize os temas em grandes secções.
 
2. O conteúdo interessa aos outros, ou interessa-me a mim?
Esta é a pergunta seguinte e é mais dolorosa. Se ponderar com serenidade, o leitor verá que muitos temas reunidos no ponto anterior só têm interesse para si ou para o seu círculo íntimo. Seja rigoroso e elimine do seu site todos os conteúdos de interesse pessoal (não, o seu cão não deve acolher os visitantes do seu site, por muito bonito e afável que seja :-)).
No entanto, pode suceder que a melhor forma de comunicar com alguns dos seus familiares e amigos seja a Internet. Para tal, crie algumas páginas privadas e envie os endereços (URL) aos destinatários específicos, tendo o cuidado de não incluir nas páginas públicas quaisquer ponteiros (links) para as páginas privadas.
 
3. Qual é a minha audiência alvo?
A Web tem o potencial de chegar toda a gente, em toda a parte. Por isso, o leitor deve ter em conta a possibilidade de ser lido por qualquer pessoa de qualquer parte do mundo.
Partindo deste ponto, o leitor tem várias formas de se dirigir a uma audiência mais específica. Ao escolher a língua, os assuntos a tratar, as referências geográficas, as ligações para outros sites, a linguagem usada, etc., o leitor dirigir-se-á preferencialmente a certos grupos, ainda que possa ser visitado por outros.
 
4. O conteúdo está apresentado de forma adequada à audiência alvo?
Uma vez identificada a audiência alvo, deve adaptar os conteúdos a essa audiência. Deve preocupar-se com a organização dos temas, a apresentação das páginas, a extensão dos parágrafos, o número e tipo de imagens, o nível da linguagem, a versão de HTML usada, etc..
Num mesmo site pode ter conteúdos para várias audiências desde que a navegação desde a entrada até aos diversos temas seja compreensível e agradável para todas as audiências alvo.
Da resposta a esta pergunta nasce a grande diversidade de sites, uns só com texto, outros com muitas imagens, com equações, com plug-ins ou com conteúdos multimedia. Naturalmente, as regras de excelência são diferentes para cada tipo de destinatários, mas não deve perder-se de vista a preocupação com a largura de banda limitada e com a visita de utilizadores diferentes das audiências alvos.
 
5. O conteúdo é relevante, ou é uma banalidade?
Esta é outra pergunta dolorosa. Analise friamente os conteúdos que se propõe publicar e elimine as banalidades. Não vale a pena publicar as suas listas de ponteiros (bookmarks, favorites, ...) tendo à cabeça os endereços dos sites de renome mundial nessa área. Acha que alguém irá procurar à sua página o endereço do "Yahoo!"? Também não vale a pena publicar duas ou três fotografias "representativas" da sua cidade ou país, do seu clube ou actor/actriz favoritos. Em vez disso, inclua um ponteiro para um site dedicado a estes temas.
É importante não ter medo de ligar a outros sites. Se conhece algum site sobre o tema que escolheu melhor do que o seu, dirija o visitante para lá, de preferência com um comentário. Lembre-se: o seu objectivo é servir o utilizador.
Reflicta de novo sobre os conteúdos pessoais que se propõe publicar. São mesmo relevantes para uma audiência de desconhecidos ? Por exemplo, vale a pena publicar um diário na Web ? Verá que alguns desses conteúdos são triviais ou narcisistas e que caberão quando muito num "cantinho" com o seu curriculum vitae ou numa secção de notas muito pessoais.
Lembre-se que o visitante só constatará que os seus conteúdos não valem a pena depois de perder tempo a lê-los. Se ele chegar ao fim insatisfeito terá menos vontade de continuar no seu site e partirá para outro. O que não falta na Web são sites interessantes.
 
6. Qual o valor acrescentado que entrego ao visitante ?
Em cada documento apresentado ao visitante há uma parte da informação que é valor acrescentado e outra que é contexto. Nas páginas da Web há ainda uma terceira fracção relativa ao interface, que se deve tentar minimizar para não distrair o visitante do essencial.
Por exemplo, nesta página, começo com uma introdução de contexto, seguida dos dois capítulos de valor acrescentado sobre os conteúdos e os interfaces. Fecho a página com um capítulo de contexto com conclusões e ligações a outras páginas relevantes.
É o valor acrescentado que cativa o visitante. Por vezes é difícil definir o que é o valor acrescentado. Pode ser a informação objectiva do texto e das imagens, mas também pode ser uma atmosfera, o humor ou a estética dos conteúdos. A posteriori é fácil descobri-lo: basta ver quais as páginas mais visitadas, as páginas com visitas mais longas e aquelas que suscitam mais correio dos visitantes.
Se incluir no seu site uma lista de ponteiros (bookmarks, favorites, ...) acrescente um comentário a cada referência explicando porque gosta dela. Se combinar no seu site ponteiros e conteúdos próprios (como eu) ponha no topo os seus conteúdos e a seguir os ponteiros para que o visitante aprecie o valor acrescentado que preparou para ele, antes de partir para outro site (os seus conteúdos são de valor acrescentado, não é assim? Pelo menos deveriam ser, se passaram o exame da pergunta anterior...)
Se o seu site fôr dedicado sobretudo a conteúdos próprios de grande valor acrescentado, procure organizá-los por temas ou graus de relevância de modo a guiar o visitante.
O relevo deve ser dado ao conteúdo de valor acrescentado, quer na organização da arquitectura do site - deve ser facilmente acessível e por várias entradas - quer na organização da página.
Finalmente, se verificar que uma secção do site ou uma página têm muito contexto e pouco valor acrescentado, pense em juntá-la a outra, eliminá-la ou suspendê-la até que o valor acrescentado justifique a visita.
 
7. A forma do site adapta-se aos conteúdos ou são os conteúdos que se adaptam à forma do site?
Quando se desenha um site de raiz a forma deve estar adaptada ao conteúdo. Os problemas surgem quando o site passa a acolher novos conteúdos, sobretudo se estes forem de tipos diferentes. As soluções são várias: criar sub-sites com forma própria, correndo o risco de perder a consistência do conjunto, adaptar a forma aos novos tipos de conteúdos ou mais simplesmente adaptar os conteúdos à forma existente.
As soluções mais correntes são a segunda (aceitável) e a terceira (péssima). Alguns sites optam pela primeira, frequentemente criando uma nova janela de menores dimensões onde apresentam os conteúdos que não "cabem" no modelo normal.
Para sites de pequena dimensão o melhor é criar uma forma flexível que possa acolher os diversos tipos de conteúdo, porventura com pequenas variações.
O leitor deve também pensar que os sites não são eternos e que por vezes haverá que mudar a forma do site, conservando os antigos conteúdos. É importante pensar em flexibilidade, escalabilidade e convertibilidade ao conceber um site, para que uma renovação não se torne num pesadelo e no desperdício de um imenso trabalho de design.

  Se o leitor se dedica a sites institucionais já terá resolvido a priori algumas dessas perguntas e por isso dirijo-me sobretudo a quem cria páginas pessoais. Não obstante, há muitos sites profissionais que ignoram estes princípios. Há sites que abrem com uma longa carta do administrador, enquanto outros reproduzem o organigrama da empresa no sistema de navegação, obrigando o visitante a saltar entre secções à procura de informações diferentes sobre um mesmo produto.

Os interfaces da Web são heterogéneos

  Os programas de edição para a Web, tal como a maioria dos autores de páginas HTML, encaram a publicação em Internet como encaravam os outros meios de comunicação: quer no papel, quer na televisão, é possível definir exactamente a apresentação dos conteúdos porque o interface com o utilizador é especificado e/ou conhecido do designer. Pelo contrário, a Internet é acedida por dispositivos de formato diferente, com capacidades e protocolos muito variáveis, sem controlo por parte do designer.

  Até 1997, a esmagadora maioria dos utilizadores recorria a computadores para aceder à Internet, de preferência com grandes monitores. Contudo, nos anos seguintes (1998-2000) novos dispositivos ganharam popularidade: os computadores de bolso (Personal Digital Assistant), as set-top boxes para televisão, video-telefones e até telemóveis. Estes últimos têm écrans tão pequenos que exigem um protocolo específico, mas os restantes implementam o protocolo normal, HTTP. Dizem os gurus e consultores que esta tendência acentuar-se-á nos próximos anos.

  Por tudo isto, parece-me conveniente continuar a desenhar os sites de forma a que sejam acessíveis a utilizadores com interfaces modestos: cerca de 600 pixels de largura de página, écran monocromático, páginas compatíveis com HTML 3. Antes de utilizar técnicas mais avançadas, o leitor deve ponderar as perguntas seguintes:

1. Qual a audiência alvo?
O tipo de audiência depende do conteúdo do site, e o dispositivo de acesso também. Se o seu site fornece previsões meteorológicas é mais provável ser visitado por utilizadores com interfaces limitados do que se apresentar um museu virtual. Mas, tal como foi referido atrás, haverá sempre visitantes que escapam ao perfil que o leitor imaginou. Apresentar uma página ilegível é como bater com a porta na cara dos visitantes.
 
2. A página de abertura é acessível a todos?
Quando um utilizador visita um site desconhecido, lê quase sempre a página de entrada (home page): se descobriu o endereço por um anúncio ou sugestão de amigos começa por aí, se seguiu o resultado de um motor de busca entra por uma "porta lateral" e com frequência dirige-se à página de entrada para se orientar. A página de entrada deve ser legível por todos, ilustrar o conteúdo do site, e porventura justificar porque motivo o seu site exige recursos adicionais (tamanho écran, plug-ins, etc.). Caso contrário, o visitante sentir-se-á desconfortável e com pouca vontade de se adaptar às exigências do criador.
 
3. O design degrada-se suavemente na presença de interfaces limitados?
As páginas são legíveis em écrans monocromáticos? E são legíveis se a janela fôr pequena? É possível perceber as páginas sem imagens ? As letras são suficientemente grandes ? Há alternativas ao uso dos plug-ins? As páginas são visíveis sem DHTML ou sem JavaScript ?
Uma resposta negativa a qualquer destas perguntas desilude uma parte dos seus visitantes e pode mesmo mandá-los embora. Quando cria páginas mais exigentes tenha o cuidado de oferecer algo aos visitantes mais limitados, senão eles sentir-se-ão excluídos. Se isso fôr de todo impossível, avise-os antecipadamente, para evitar a reacção deles ao esperar por uma página pesada e receber um erro no fim. :-(
 
4. O design é revolucionário ou semelhante aos modelos já conhecidos?
O leitor concordará que os visitantes do seu site passam a maioria do tempo noutros sites ("lei" de Jakob). Por isso, propôr um design revolucionário, contrário ou apenas diferente do normal, constitui uma barreira à entrada do seu site. Assegure-se que a inovação vale o esforço de aprendizagem e ajude o visitante nesse esforço, senão ele vai-se embora.
Evite também variações irrelevantes aos padrões correntes. Por exemplo, não use sublinhados a não ser para os links e se quiser incluir um menu de navegação, ponha-o à esquerda e não à direita.
Em caso de dúvida, faça um esqueleto do design e teste-o previamente com algumas pessoas conhecidas. Os resultados serão decerto muito instrutivos.
 
5. Qual o esforço necessário para mudar o modelo de design do site?
Se a publicação de livros ou filmes parece uma acto final e definitivo, já os sites mudam frequentemente. Quando é necessário incluir os conteúdos pré-existentes num modelo (template) novo, deita-se fora o trabalho de design anterior. Mas se não houver planeamento, é também necessário deitar fora o conteúdo e reescrever o site de raiz.

  Depois de definido um modelo, siga-o escrupulosamente de modo a criar um padrão que ajude o visitante e lhe transmita uma sensação de conforto, de "estar em casa". Quando o site estiver pronto, visite-o com computadores diferentes e browsers diferentes. Reveja minuciosamente todas as páginas antes de as publicar - instale o site no servidor numa pasta (directório) privado durante os testes. Meça os tempos de acesso, desligue as imagens, mude o tamanho da janela.

  Por fim, não confie absolutamente nas suas respostas. Peça aos seus amigos para fazer um teste de utilização. Nesta fase, é essencial a meia dúzia de pessoas que visitará o seu site, independentemente do conteúdo. ;-) Recomende-lhes que sejam exigentes e recompense a disponibilidade e boa vontade deles com uma sessão de críticas francas pois quase toda a gente gosta de criticar o trabalho alheio. :-)

  Depois do seu ego estar um bocado amachucado, analise friamente as críticas e sugestões. Reconheçerá que eles têm razão na maioria dos casos. Faça as revisões necessárias e depois lance a sua criação na World Wide Web para que todos possamos tirar partido dela.

  De vez em quando, o leitor receberá uma mensagem de apreço e então sentir-se-á finalmente recompensado por tanto trabalho.

Conclusão: conteúdo orientado para o utilizador

  Claro que há excepções a estas regras. Há autores que defendem a política da vida transparente na Internet e publicam tudo o que lhes passa pela cabeça (e incluem uma webcam para os vermos em directo). Outros têm pouco tempo para criar um bom site e limitam-se a converter os conteúdos originários de outros meios de comunicação.

  Outros ainda pensam que basta existir uma só pessoa no mundo interessada naquele assunto para que valha a pena publicá-lo. A esses respondo que se a publicação na Web é quase gratuita, o tempo dos internautas não é. Peço-lhes a cortesia de filtrarem os utilizadores, informando-os previamente sobre os conteúdos apontados, para assim minimizarem o número de desiludidos.

  Há também autores para quem o web design é uma arte. Nestes casos a forma e o conteúdo fundem-se, constituindo o objecto principal do site. As páginas destinam-se a ser vistas em tamanhos certos, com browsers determinados, por visitantes com tempo disponível e com um espírito aberto à surpresa e ao encantamento. São candidatos directos as prémios de design, tais como os Webby Awards, e destinam-se à audiência restrita dos web designers e apreciadores de arte na Web.

  A propósito, quantas vezes já visitou um site só por causa do design, sem ligar aos conteúdos? E quanto tempo permanece num site com um design sofisticado e conteúdos apenas suficientes ou mesmo medíocres?

   As reflexões anteriores são fruto da experiência como visitante e autor de páginas. São apenas as minhas opiniões. Convido os leitores que discordam delas a conversar comigo sobre o assunto. Aos leitores que concordam com a maioria do que escrevi, estas notas podem parecer óbvias. Convido-os a navegar na Web com estas ideias em mente. Encontrarão decerto muitos sites que ignoram estas regras simples que parecem ser o senso comum. Lembrem-se delas quando chegar a hora de passar de visitante a criador de conteúdos para a World Wide Web.

Em suma, a minha máxima para a construção de um bom site é:

Conteúdo orientado para o utilizador

A forma é de somenos importância...

Abril 2000

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